Jornalista William Costa publica livro de crônicas

Nos idos do século XX, um escritor de nome João do Rio já falava da alma e dos personagens da rua. Neste hábito de flanar, nasce a poesia das palavras através do olhar sensibilizado dos contadores de histórias reais ou que carregam certas doses de fantasia.

Foto: Antonio David

O campinense William Costa resgatou essa essência no seu ofício de jornalista. “Quem aspira ser aprendiz de cronista deveria ter o direito constitucional de perambular pela cidade”, diz em um dos seus textos.

Neste contar cabem as lembranças de um sertão menino, da natureza em paisagens e cantar de passarinho, o amor, a paixão e até mesmo a metalinguagem. No olhar que não se perde, ainda acrescenta-se as questões sociais no ninho de palavras.

William Costa mora em João Pessoa (PB) desde 1972. É formado em jornalismo e iniciou sua vida profissional na Rádio Tabajara. Trabalhou nos principais jornais do estado e em revistas.

Atualmente é editor do suplemento literário Correio das Artes, do jornal A União. Suas crônicas agora saltam das páginas dos jornais e ganham espaço no seu primeiro livro, intitulado Para tocar tuas mãos – Chronesis. O Conexão Boas Notícias conversou com o cronista sobre a obra, o gênero e jornalismo cultural.

Onde nasce o cronista no profissional de jornalismo?

É um parto em longo prazo, e resulta do casamento do exercício constante da escrita, no jornal, com a leitura dos bons cronistas. Na verdade, embora eu seja apaixonado pela crônica, e a pratique há vários anos, só mais tarde tive coragem de me assumir como cronista e, principalmente, reunir alguns trabalhos, neste gênero textual, em livro.

Além de crônicas inéditas, o livro Para tocar tuas mãos – Chronesis também traz textos que já foram publicados. Como foi revisitar essas crônicas e reescrevê-las?

Imagem: Divulgação/Capa

Este foi um processo de aprendizado. Revisitando dezenas de textos já publicados em jornais e revistas, o que proporcionou muita emoção, percebi, sem falsa modéstia, o quanto havia evoluído, ao longo de trinta anos de exercício do jornalismo, em termos de construção textual. Isso não quer dizer que faço algo de excepcional. Nada disso. A comparação é com os textos de iniciante com aqueles escritos após mais trinta anos de jornalismo, entende? Então apliquei essa experiência na reescritura das crônicas, consertando muita coisa, em termos de estilo e de ortografia, inclusive, até harmonizar as crônicas já publicadas com o núcleo inédito, do ponto de vista temático e da linguagem.

Como faz o jornalista para não perder a sensibilidade e a poesia em meio à correria cotidiana e a cobertura de fatos tão negativos?

No meu caso, a leitura constante, diária, mesmo, de literatura, filosofia, mitologia e religião, por exemplo, é imprescindível para a manutenção de um sentimento, digamos assim, poético, filosófico, espiritual, em relação à vida. Isso sem ‘intelectualismo’, mas por deleite, mesmo. Invisto o possível na espiritualidade, para não perder a emoção; o encantamento com o Universo, com a criação, em todos os sentidos. Aconselho encontrar tempo, seja como for, para caminhar; deitar sobre a natureza e as miudezas cotidianas um olhar mais contemplativo que julgador.

Foto: Antonio David

Nas suas crônicas, além do “eles” típico das notícias impessoais, há também um “eu”. Este gênero também é uma forma de fuga desse engessamento?

A crônica, digamos assim, “clássica”, é autobiográfica. Penso que o cronista é o centro desse universo textual. A autorreflexão, em maior ou menor grau, que a crônica impõe, funciona como um mecanismo de libertação das amarras da chamada ‘vida prática’; de um cotidiano que, em resumo, e infelizmente, ainda se reduz às relações de compra, venda e troca.

Qual análise você faz do jornalismo cultural que é feito hoje na Paraíba?

Vejo o jornalismo cultural com certa dificuldade, material e humana, por exemplo, no sentido de dar conta do que poderíamos chamar de “atividade artística e intelectual”, que é grande, dinâmica e diversa. Mas isso não é um problema exclusivamente nosso. De uma maneira geral, no Brasil, as empresas não investem em capacitação, de modo a cobrir, com um grau maior de eficácia, esse complexo que chamamos de cultura. Exemplo disso é o encolhimento dos cadernos de cultura e o desaparecimento gradual dos suplementos literários. Bem, o próprio jornalismo impresso passa por um momento de crise.

Foto: Antônio David

Algo mudou na sua forma de escrever, da sua primeira crônica até aqui? O quê?

Comparando uma crônica de hoje com uma escrita, por exemplo, há dez anos, percebo uma evolução muito grande, inclusive nos aspectos gramaticais. Mas diria, em resumo, que a valorização do processo de elaboração do texto, usando, em escala maior, a função poética da linguagem, é o que diferencia as crônicas do passado e do presente.


Por Marcella Machado, da redação do Conexão Boas Notícias

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