Casal de fotógrafos registra cabelo afro de crianças ao redor do mundo

Kahran Bethencourt e o marido, que moram em Atlanta (EUA), buscam quebrar estereótipos e celebrar a beleza das crianças negras e de seus fios naturais

Folhear um livro e se ver representado. Olhar uma foto e se sentir deslumbrante! Essas são algumas das sensações que crianças negras de várias partes do mundo podem experimentar quando cruzam com o trabalho da fotógrafa norte-americana Kahran Bethencourt, 41 anos, e do marido e colega de profissão, o filipino Regis Bethencourt, 43 anos.

O casal, que mora em Atlanta (EUA), mergulhou a fundo em projetos pessoais com um objetivo principal: derrubar estereótipos e enaltecer a beleza das crianças negras de várias idades – com seu cabelo afro em estado natural.

“Nós queríamos que elas se sentissem representadas; não importa onde estivessem”, afirmou Kahran. Com câmeras em mãos, os profissionais dão asas à imaginação dos pequenos. Através de suas lentes, meninos e meninas podem ser o que quiserem: desde DJs, ativistas ou quem sabe até astronautas!

_______

“Espero inspirar crianças ao redor do mundo para elas enxergarem um futuro maior do que originalmente imaginariam”, diz a profissional. 

_______

337 Ensaio Cabelo Afro No Quênia, os pequenos fizeram uma homenagem à lendária tribo Maasai, de seus ancestrais. Foto: CreativeSoul Photography | Reprodução | Conexão Boas Notícias

Estar entre os pequenos faz parte da rotina de Kahran e Regis. Os dois já retrataram em torno de mil crianças em vários países do mundo, além de terem seu trabalho reconhecido mundialmente. O casal, que se conheceu em um fórum de designers gráficos, começou a fotografar de forma amadora as crianças da vizinhança na garagem da mãe de Kahran. Em 2006, Regis iniciou um curso de fotografia e acabou compartilhando com a esposa o que aprendia. Foi só após três anos que decidiram abrir a própria empresa, a CreativeSoul Photography. 

Na jornada profissional, a fotógrafa sentiu que precisava buscar um estilo próprio: “Quando começamos, estávamos indo com o fluxo e fazendo de tudo para nos encaixar. Fotografávamos editoriais de moda infantil, por exemplo”, diz Kahran. “Foi nesse momento que percebemos que esse setor não era muito diverso. Deixar os fios naturais não era tão comum entre os modelos mirins”, lembra.

A norte-americana explica que os pais acreditavam que as crianças precisavam alisar o cabelo para conseguirem espaço no mercado. Por isso, ela e Regis assumiram a responsabilidade de fazer trabalhos que de fato mostrassem a beleza real do cabelo afro.

Black power

337 Ensaio Cabelo Afro Diversão: o livro dá corda à imaginação da garota. Foto: CreativeSoul Photography | Reprodução | Conexão Boas Notícias

Inspirado por esse desejo de empoderar as crianças negras, o casal iniciou o projeto pessoal The AfroArt Series, em 2017. Sem cobrar pelas sessões, clicavam os pequenos com seu cabelo natural. “A ideia era fazer retratos bem fortes dessas crianças, com o nosso estilo”, conta a fotógrafa. Em sua infância, Kahran lembra que ela [que é negra, assim como o marido] não tinha uma boa relação com seu cabelo, tanto que o alisava desde cedo. “Não conheci meu cabelo natural até os 20 anos. Cresci nos anos 80 e, nessa época, não era aceitável ter nosso cabelo solto. Espero que esta geração seja diferente.”

Com a série The AfroArt Series, os fotógrafos começaram a viajar por várias cidades pelos Estados Unidos. Em 2018, o trabalho da dupla se tornou viral e abriu novas portas para eles. Com o sucesso dos ensaios, se aventuraram em um novo desafio: produzir um livro para mostrar a beleza das crianças negras em várias partes do mundo. Para o projeto, o casal viajou por vários países, como Quênia, Gana, África do Sul, Reino Unido, França, Holanda, Itália, Grécia e Cuba. O resultado foi Glory: Magical Visions of Black Beauty (Editora St. Martin’s Press), publicado em 2020.

Da ativista à neurocientista

337 Ensaio Cabelo Afro Criança pode ser o que quiser, inclusive uma especialista em neurociência. Foto: CreativeSoul Photography | Reprodução | Conexão Boas Notícias 

“Realmente queríamos mostrar a excelência negra e revelar que as crianças estão fazendo coisas incríveis”, diz Kahran. A fotógrafa, aliás, se encantou tanto com a história dos pequenos que decidiu incluí-las no livro. Em uma de suas viagens, por exemplo, conheceu uma menina de 8 anos, que era fissurada por neurociência, e uma pequena ativista, que lutava por poder usar seu cabelo afro nas escolas sul-africanas.

O livro Glory conta com cem fotos incríveis e coloca as crianças em cenários que se referem ao passado, presente e futuro. O afrofuturismo, aliás, é uma das temáticas que mais encantam Kahran. “Temos de ser criativos e pensar fora da caixa”, diz. Segundo ela, os pequenos  também gostam de temas futuristas, pois conseguem ter uma imagem de si que nunca viram antes.

Para a profissional, o entusiasmo das crianças após a publicação da obra não foi apenas por estarem representadas, “mas por entrarem em uma livraria, se verem e terem suas histórias registradas”. E o sucesso do projeto do casal foi para além das livrarias e invadiu as salas de aula. “Soubemos de professores que usaram o nosso trabalho para ensinar não só sobre diversidade, mas também sobre autoconfiança e amor-próprio”, conta a fotógrafa.

Criar pontes para que os pequenos se sintam confortáveis com a sua pele e o seu cabelo é um trabalho contínuo do casal: “Acho que há muitos estereótipos negativos na mídia, não apenas com relação aos afro-americanos, mas com africanos de todos os lugares. Eu quero mostrar narrativas diferentes. Quero mostrar que essas crianças têm grandes sonhos e esperanças”, conclui Kahran.

“Pais, não alisem o cabelo de seus filhos!”

337 Ensaio Cabelo Afro Barbearia em Nova York (EUA): meninos “brincam” de cuidar dos cabelos. Foto: CreativeSoul Photography  | Reprodução | Conexão Boas Notícias 

Quando cruza com uma mãe ou pai de crianças que têm cabelo crespo ou cacheado, a terapeuta capilar e holística Eliane Serafim, de São Paulo (SP), tem sempre esse conselho na ponta da língua. Criadora do instituto Encrespa Geral, a especialista explica que valorizar o cabelo natural dos pequenos é uma forma de aumentar a autoestima deles.

Além disso, é bom lembrar que a própria Anvisa alerta que não existem alisantes capilares destinados ao público infantil. Segundo Eliane, aplicar um produto químico no couro cabeludo da criança, que é bem sensível, também pode trazer danos, como a quebra dos fios.

Para a especialista, incentivar a valorização do cabelo crespo e cacheado não deve partir apenas de uma atitude dos pais e, sim, de uma mudança de comportamento social. O cabelo é a porta para o racismo. “Enquanto cresce, a criança ouve que seu cabelo é duro. É como dizer que parte do seu corpo não serve para ela. Isso afeta sua autoestima e vai bloquear suas conquistas, porque ela se sente incapaz e insegura”, diz Eliane Serafim. Para ela, é fundamental elogiar a beleza da criança negra: “Muitas vezes, ela se sente menos em relação às outras. Ela precisa se sentir especial”, diz.

Em busca de iguais

337 Ensaio Cabelo Afro Homenagem às quatro meninas que morreram em um atentado numa igreja, nos Estados Unidos, vítimas de racismo. Foto: CreativeSoul Photography   | Reprodução | Conexão Boas Notícias  

Outro ponto que a terapeuta capilar destaca é a representatividade. Muitos pais já se depararam com frases dos filhos, como: “Não gosto do meu cabelo” ou “Meu cabelo é ruim”. De acordo com a especialista, a chave para enfrentar essa questão é mostrar outras pessoas iguais a eles. Uma atriz, um cantor, uma jornalista ou um personagem de livro negros.

“Representatividade é tudo!”, reforça Eliane. A especialista afirma que quando as mães e os pais também mantêm o cabelo de forma natural isso incentiva  as crianças a gostarem mais de seus cabelos.

E para valorizar e deixar os fios sempre saudáveis e bonitos, não há segredos, segundo a profissional. Basta hidratar o cabelo crespo ou cacheado uma vez por semana, com produtos destinados ao público infantil. Além disso, não se esqueça: sempre penteie o cabelo dos pequenos quando ele estiver úmido e com creme, de preferência durante o banho. “Se pentear a seco, a criança vai chorar e isso pode criar aquela relação de que cuidar do cabelo dói”, diz Eliane.

Beleza única

“Tentamos combater esses estereótipos em nossa fotografia, mostrando diversas imagens de crianças que amam a pele em que estão, seus próprios cachos naturais e sua cultura.” (Kahran Bethencourt e Regis Bethencourt | Reprodução | Conexão Boas Notícias 
“Os jovens modelos apresentados na série usam roupas ousadas com facilidade e confiança.”  | Reprodução | Conexão Boas Notícias  
Regis e Kahran não esperavam que a série decolasse como aconteceu, mas se tornou um sucesso com muitos espectadores | Reprodução | Conexão Boas Notícias   
Cada sessão de fotos tem sua própria atmosfera, incluindo esta que lembra algumas décadas atrás Retrô | Reprodução | Conexão Boas Notícias   
Outras imagens têm uma decoração minimalista e ainda conseguem se manter como parte da série | Reprodução | Conexão Boas Notícias   


Com informações: Revista Crescer / Daily Mail

Edição: Josy Gomes Murta


Leia e Compartilhe boas notícias com amigos nas redes sociais…

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.